Há duas semanas regressou aos “Proms”, e persiste a ideia de
que Grosvenor procura exprimir algo acerca da sua personalidade através do
repertório que elege interpretar. Passeou pela evanescente “Paisagens”, de
Mompou, e estreou a sonâmbula “Day Break Shadows Flee”, de Judith Weir, peça
afetada por intuições hipnológicas. E, escutando este “Dances”, em que reproduz
o programa apresentado no Festival de Sintra de 2013, cedo se conclui que
também por Bach se move noctambulamente. A mecânica na Ouvertüre da “Partita Nº 4” é volátil e a Allemande é quase refratária. Como na mais monumental arquitetura,
o esplendor da forma no Minuete ou na Jiga praticamente obstrui a utilidade da
função. Mas, como um momento de lucidez mental num amnésico, instantes há em
que o pianista dá mostras de possuir consciência de tudo isto, ficando a visão
de conjunto espantosamente clara. O seu Chopin não deixa nada ao acaso. O
opúsculo 22 – o “Andante spianato et Grande Polonaise brillante” – lembra fogo-de-artifício
em câmara lenta. E na “Polonesa Nº 5” o domínio narrativo é total: a fase de
recapitulação parece dizer respeito a uma obra ouvida há muitos anos atrás. Cordiais
e galantes, estão três das “Dez Mazurcas”, de Scriabin. E, nesta versão, a
“Valsa em Lá bemol maior”, ainda do russo, afigura-se como a semente de
qualquer coisa que viria apenas a florescer na orquestra de Duke Ellington. Uma
escolha insólita: “Valsas Poéticas”, de Granados, de uma altura em que o
espanhol, emigrado, escrevia a partir de teclados sem acentos. Por fim, três encores que revelam pouca maturidade e
tremendas faculdades pirotécnicas. Aos 22 anos, talvez seja pelo melhor.
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