Sunwook Kim (p), Alban Gerhardt (vc), Wu Wei (sheng), Seoul Philharmonic
Orchestra, Myung-Whun Chung (d)
Coisa rara, esta, de vir um CD inaugurar um conjunto de
primeiras gravações de obras de uma compositora contemporânea familiar a palcos
portugueses. Eis o “Shu para Sheng e Orquestra”, que Wei levou ao CCB, em
janeiro, ou o “Concerto para Violoncelo”, que Gerhardt conduzirá à Sala Suggia,
na Casa da Música, dia 27 deste mês. Aliás, este ano, Unsuk Chin é a
‘Compositora em Residência’ na instituição portuense. Com o “Concerto para
Piano” possuem, um e outro, uma atmosfera de encantamentos e sortilégios,
sujeita à pressão de forças primitivas que só a ironia tempera – daí soar o que
se consagra ao instrumento de palheta livre tão conscientemente ritualista e
exótico. Já Kim toca com espírito de ferreiro mas cada martelada produz algo
com a solidez de pingos de chuva em areia molhada. Trata-se aqui de espelhos e
labirintos, de mecanismos em contratempo. A sugerir uma imagem, seria a de um
ser humano a regredir da velhice à infância, ou qualquer outra que inspire a
ilusão de simplificar o que jamais terá interpretação fácil. Instantes há em
que as notas circulam do mandolim para a marimba, do flautim para o fagote, do
tímpano para o trombone, como numa coreografia desenvolvida por Carl Stalling
para a Warner Bros. ou por Scott Bradley para a MGM. No “Concerto para
Violoncelo” tudo começa com Gerhardt, como a ponta do edifício mais alto de uma
cidade submersa a erguer-se das águas. No fim, violoncelo e orquestra lutam
como dois rivais que se cruzem na clareira de uma floresta: mais veloz um, mais
forte o outro, ferem-se mutuamente e logo regressam às sombras em que Chin os
aguarda.
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