O
CD abre com uma ‘You and the Night and the Music’ de salto alto, acrobático exercício
de contraponto entre as mãos esquerda e direita de Hersch que traz à memória os
duetos de Luiz Eça e Bill Evans que um espírito tão furtivo quão precavido
soube em boa hora gravar para a posteridade. Depois vem o tema titular e logo o
caso muda de figura: num filme, seria de noite, faiscariam de modo metronómico
as luminárias numa autoestrada e a música estaria colada àquela cena em que tudo
o que há de inexplicável entre um casal ganha dramática representação nos pingos
de chuva que escorrem em silêncio pelo para-brisa. Isto para dizer que, mesmo na
sua mais exuberante expressão, é de intimidade que Hersch se ocupa. Talvez por
isso, para estudá-lo, tenham um dia ido até si Brad Mehldau ou Ethan Iverson,
dois pianistas que se interessam igualmente por sintetizar de forma excecional
a elegância e a excelência que historicamente o jazz sempre possuiu. ‘Far
Away’, um original, é dedicado a Shimrit Shoshan (1983-2012) e trata do
desgosto, e quase se pressente uma canção a querer romper a harmonia a duas
vozes, a primeira a esticar os braços para o sol, a segunda a permitir-se
enrolar numa mortalha. Mas todo o álbum é fluentemente lógico e suave. E quando
encontra Monk – com ‘Let’s Cool One’ – esbarra com aquele que se levantava do
piano e dava um pezinho de dança, ao contrário do outro, meditabundo, que
empilhava acordes como se fossem pratos sujos num restaurante e ele tivesse
de os lavar. Referindo-se a John Hébert e Eric McPherson, Hersch diz: “Temos
tanta confiança uns nos outros que chegamos a deixar para trás o espaço.”
Flutuam.
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