Entre sets, passava já da uma da manhã, Mat Maneri escondia a timidez com
um capuz. Quente e húmida, era uma daquelas noites de agosto que só existem na
imaginação e, nas traseiras do Hot Clube, em Lisboa, o violetista perseguia com
olhar cúmplice os gatos que mergulhavam na folhagem do Jardim Botânico.
Estávamos em 2000. De modo febril, falava de um sem número de projetos: do seu
disco a solo (“Trinity”, lançado no ano seguinte na ECM), de uma sessão com Joe
Maneri, Roy Campbell ou Barre Phillips (que veria a luz do dia como “Going to
Church”, na Aum Fidelity) ou da publicação de numeroso material de arquivo.
Tudo isto a sair em breve no seu próprio selo. Enquanto isso, no pátio, Gerald
Cleaver e Chris Lightcap trocavam impressões e, num casaco de ganga
impossivelmente justo, Joe Morris dirigia-se na nossa direção. Era o “Jazz em
Agosto” e durante três noites o quarteto do guitarrista deslocava a ação do
festival para a Praça da Alegria. “Somos amigos”, dizia Morris, à medida que
Maneri desaparecia no escuro: “Temos estilos diferentes, mas sempre que um de
nós tem alguma coisa a dizer o outro compreende-o perfeitamente. Acho que o que
nos une é querermos produzir boa música”. Numa conversa de circunstância conferia
importância ao rigor estrutural, dizia pouco simpatizar com formas de expressão
mais emotivas e, no entanto, confessava não fazer ideia o que lhe reservava o
futuro. Não sabia certamente que o seu quarteto haveria de se desentender e
voltar às gravações apenas com este “Balance”. Ou, muito menos, que continuaria
a evoluir ainda que inativo. Maior elogio não há.
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