Eric Charry, autor de “Mande
Music”, uma influente antologia obviamente consagrada à música mandinga,
introduz deste modo o subcapítulo em que toma por tema os principais estilos de
expressão à guitarra da era moderna: “A divisão administrativa da pátria
mandinga entre Mali e Guiné gerou importantes ramificações nas formas de
guitarrear dos dois países.” Libertando-o do fardo da geopolítica e mais ainda
do da etnomusicologia, cedo se percebe ao que se refere: de modo a obter o
favor e o patrocínio dos ricos e poderosos, quando se separaram os membros da
federação da África Ocidental Francesa, os músicos do lado maliano tiveram de
rumar para norte, fronte ao vento, em direção a Bamako, sujeitando-se àquele
som de espanta-espíritos em que nas corás ecoavam os alaúdes do Sahel; já os
que deram por si em território guineense desviaram-se para sudoeste, cortando o
meridiano e a savana até Conacri e navegando pelas ondulantes melodias do balafon. O que, simplificando, explica a
preferência de uns pela escala pentatónica e de outros pela escala maior. Ou
seja, para melhor situar a peleja, comparada com aquelas melancólicas e ocres ruminações
que Ali Farka Touré esboçava bem para lá de Tombuctu, por exemplo, esta
guitarra de Djessou Mory Kanté, de caráter jovial e convivial, é aqui pintada
com os tons do hino à alegria. Nada que, em finais dos anos 90, na Popular
African Music, de Günter Gretz, não tivesse já deixado patente em “Guitare Sèche”,
a sua primeira edição em nome próprio após uma mão-cheia de gravações com Kanté
Manfila, o mais famoso dos seus irmãos. Mas, também, algo que se explica apenas
pela data desta sua passagem pelo estúdio de Salif Keita, seu principal
empregador: maio de 2012, antes da epidemia do ébola. Isto é, os dois anos e
meio que a Sterns demorou a lançar este disco serviram para o transformar numa improvável
missa por uma Guiné largada no patíbulo.
Sem comentários:
Enviar um comentário