26 de setembro de 2015

“Figures of Harmony: Songs of Codex Chantilly c. 1390” (Arcana, 2015)




Ferrara Ensemble, Crawford Young (d)


Todo ele notável, Corps Femenin: Duke John of Berry’s Lyrical Avant-Garde”, o mais recente dos discos aqui coligidos, editado em 2010, possui notas de apresentação não menos célebres. Nelas, Crawford Young sugeria que se Dante tivesse começado a escrever a sua famosa descrição do inferno no início do século XV, i.e., 100 anos mais tarde, incluiria entre os seus residentes o ilustre João de Valois, Duque de Berry, amigo de Machaut e destacado patrono das artes, que para toda a parte se dirigia acompanhado por um casal de ursos e de quem aproveita, já agora, para esboçar um retrato entre o avaro e o voraz. A ideia é inspirada e serve para atalhar caminho, pois logo semeia expetativas quanto à música que semelhante figura permitiria que se escutasse nos seus castelos. Grosso modo, a de Trebor, Solage, Senleches e daqueles, como Grimace, Ciconia ou Philipoctus de Caserta, que praticavam a Ars subtilior (a “arte mais refinada”, conforme a caracterizou a musicóloga Ursula Günther, distante desse tempo de pragas, pestes, tumultos e tributos sem fim) e que viram muita da sua obra reunida no Códice de Chantilly. E é uma música inimaginavelmente complicada, cifrada, ambígua, simbólica e alegórica, embora a sua construção seja continuamente charmosa e a sua configuração canónica. E, entre 1995 e 1998, em “Balades a III Chans”, “Fleurs de Vertus” e “En Doulz Chastel de Pavia”, com um invejável critério estilístico e uma conjunção sentimental e corporal inigualável, já Young e o Ferrara Ensemble a tinham posto a pairar definitivamente a vários milímetros do mundo real, rumo ao paraíso.

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