1 de outubro de 2016

Jean-Guihen Queyras, Bijan Chemirani, Keyvan Chemirani, Sokratis Sinopoulos “Thrace – Sunday Morning Sessions” (Harmonia Mundi, 2016)



Perguntam-lhe “Porquê Trácia?”, nos materiais promocionais da editora, e Jean-Guihen Queyras dá uma resposta que se diria formada em partes iguais por engenho e instinto, inteligência e imaginação: “Primeiro, porque muitas das peças que constituem o alinhamento deste disco provêm daí, dessa região da península dos Balcãs que se estende por áreas turcas, búlgaras e gregas atuais. Depois, porque os trácios, cuja civilização floresceu nos séculos terceiro e segundo antes de Cristo, foram um povo aventureiro e curioso, aberto ao intercâmbio com outras culturas, o que nos proporcionou uma metáfora muito bela para o trabalho que temos vindo a desenvolver e que tem como objetivo o estabelecimento de pontes entre tradições musicais a mundos de distância umas das outras.”

Falando acerca da sua Bósnia natal, em “Breviário Mediterrânico”, Predrag Matvejevic escreveu acerca de uma terra de cruzamentos, de ponto de encontro (e desencontro) entre Ocidente e Oriente, de fronteira, de campo de batalha para cristianismo e islão, mas também propôs a figura de um “terceiro elemento” na composição de um híbrido cultural feito de opostos como leste/oeste, norte/sul ou terra/mar mas capaz de os superar a todos. De certa forma, num quarteto tão insólito (Queyras, mais francófono do que estritamente francês, Sinopoulos, mais bizantino do que grego, e os dois irmãos Chemirani, mais latinos do que rigorosamente iranianos), não se anda longe de propor o mesmo. Mas, no caso, discutindo afinidades modais (já para não dizer morais), interpretação historicamente informada, contemporaneidade e eternidade. As cordas e os arcos do violoncelo e da lira turca (equivalente local do kamancheh persa) parecem sugerir um tratado de agógica enquanto darbukas e adufes cumprem uma função mais pedagógica. Juntos, trazem à memória outra frase de Matvejevic: “Estados e Igrejas, monarcas e prelados, legisladores laicos e religiosos esforçaram-se por dividir o espaço e os homens. Mas os laços interiores resistiram às partilhas. O Mediterrâneo é mais do que uma simples pertença.” É um destino. Esta música também.

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