Butcher
grasna, grunhe, guincha, grita e gorjeia. Berra, brama, bale e buzina. Trina,
trila e trissa. Acompanha-o Stale Solberg, percussionista norueguês que tanto
quanto o britânico ao saxofone põe em cena um ecossistema mal se senta à
bateria. Escutam-se peles, pratos e potes. Sinos, chapas e chocalhos. E perde-se
a conta ao arsenal de baquetas de que dispõe, não obstante preferir com frequência
a intimidade de roçar as pontas dos dedos húmidos pelas membranas da tarola ou
do timbalão. Ouvindo-o, salta à memória o que Butcher dizia acerca de
bateristas, numa entrevista publicada há 15 anos na “Paris Transatlantic”: “Evitei-os
durante muito tempo. Não me interessava trabalhar com aquele tipo de propulsão.
Toquei com o Paul Lovens, que operava de um modo mais espetral, mas foi o John
Stevens que me levou a ter novamente interesse pela bateria. Sem a condicionar,
ele dava um belíssimo impulso à música, deixando-a muito transparente. E isso
deve-se ao instrumento que usava, em que era tudo miniaturizado, sem grande
sustentação.” Claro que, desde então, Butcher encontrou o que procurava. E há
discos que o comprovam, como “Concentric” (com Paal Nilssen-Love) ou “Daylight”
(com Mark Sanders). Registos, como este, em que a arte triunfa sempre sobre a
técnica. Um considerando, aliás, em que se dá pelo seu moralismo. Num ensaio
incluído numa antologia dedicada à improvisação (“Aspekte der Freien
Improvisation in der Musik”, 2011), escreveu assim: “De certeza que não
teríamos a ousadia de descrever como ‘técnicas estendidas’ o recurso ao feedback de Jimi Hendrix, os ataques
percussivos de Son House com o slide
ou aquele oitavar que o volume de sopro excedentário de Albert Ayler permitia.”
Não… O que não impede que se caracterize a manipulação das frequências
fundamentais dos tons que Butcher faz ao saxofone, por exemplo, exatamente
dessa maneira. Tudo, porque – e é aí que residirá a beleza a que este título alude
– insiste em fazer música que ultrapassa a própria imaginação.
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