Nelson Freire (p), Gewandhausorchester, Riccardo
Chailly (d)
Interessante exercício de contrastes, este, que nos propõem Freire
e Chailly. Dir-se-ia, até, que a decisão de colocar peças tão distintas junto
uma à outra quererá, por si só, dizer qualquer coisa. Talvez, quiçá, que a
anunciada integral dos concertos para piano de Beethoven, agora iniciada, não ficará
excessivamente sujeita aos compromissos da programação. Isto é, que a produção
de Beethoven se manterá como um campo de ação eminentemente subjetivo. É o que
se adivinha em depoimentos de Freire reproduzidos no livreto do CD: “O
desenvolvimento nesta música é extraordinário: nenhum outro compositor
percorreu um caminho criativo tão longo” ou “tudo depende da maneira em como
nos sentimos. Criamos a música espontaneamente”. Entende-se melhor a última
declaração no que diz respeito à peça para solista. Afinal, cada vez mais se
ouve a “Sonata para Piano Nº 32 em Dó menor, Op. 111” como se de uma
improvisação de um pianista de jazz particularmente enciclopédico se tratasse. Basta,
por exemplo, observar o modo como Uchida ou Denk lhe descrevem as passagens mais
incongruentes. Não tanto pelo seu poder de síntese, claro. Mas por tudo aquilo
que, mesmo quando dá mostras de olhar para trás, prospeta ao futuro. Há algo
desse espírito – à falta de outro termo, um certo desprendimento – neste
“Concerto para Piano Nº 5 em Mi bemol maior”, vulgo “Imperador”. A diferença,
como se sabe, é que o concerto é uma obra que só faz perguntas para as quais já
tem resposta, e a sonata não. Por isso aparenta uma dirigir-se ao mundo dos
homens e outra à morada dos deuses. Em todo o caso, Freire fica melhor no
primeiro estádio. É na terra que fazem falta os poetas.
Sem comentários:
Enviar um comentário