Nova
reedição para um manifesto em que até os defeitos são congeniais. Ou seja, ainda
não foi desta que se endireitou o que em 1968 nasceu torto: os metais em
‘Miserere Nobis’ mantêm-se desafinados, o final de ‘Batmacumba’ continua colado
a cuspo, a métrica de ‘Mamãe Coragem’ insiste em engasgar Gal Costa, etc. Por
isso nem é grave que, ali, no lado direito da fac-similada capa, naquela tira
informativa a que os japoneses chamam obi,
seja o alinhamento do primeiro LP de Gilberto Gil – que a Soul Jazz relançou em
2013 – que se reproduz, e não propriamente o deste disco. Afinal, trata-se do
mesmo objeto que citava de modo impreciso o famoso metonímico de Juvenal: aquele
que se sintetiza por panem et circenses
e que se conserva como uma definitiva caracterização das manobras de diversão a
que recorrem as classes dirigentes de todas as eras. Em “Verdade Tropical”,
Caetano Veloso explica como “em meio à iconoclastia tropicalista, a reverência às
letras clássicas era a última das exigências a ocorrer a alguém”. Até porque,
lá está, relembrava este compêndio de imperfeições em que se provocava através
do pasticho e da paródia, por exemplo, sem jamais procurar a proteção da
mimese. O interesse, se é que é possível generalizá-lo, seria, antes, alcançar
de um só golpe a tragédia e a comédia que se acha em tudo o que se relaciona
com o humano. Aqui, toda a letra é polissémica, toda a música polimórfica. É a
mais celebrada alegoria para a história da música popular brasileira e sua
receção: tem poemas de Capinan e Torquato Neto, vozes e composições de Caetano,
Gil, Nara, Tom Zé, Gal, Rita Lee e os Mutantes e arranjos de Duprat. Disputa o
retrocesso civilizacional, e o seu inverso também.
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