Em
fevereiro de 2013, em entrevista ao Expresso, Jason Moran dizia que “no jazz, em
termos formais, uma dimensão fundamental é a que permite a revelação de
estilistas. As versões (…) podem dizer-nos mais sobre o virtuosismo de quem
adapta do que de quem compôs.” É uma premissa indispensável para se apreciar esta
sua homenagem a Thomas “Fats” Waller (1904-1943), feita em colaboração com
Meshell Ndegeocello, mas, também, quanto baste para que se compreenda que,
aqui, nem sempre se vislumbra inteiramente à imagem de quem – ou à luz dos
valores de que época – é que o material está a ser recriado. De Waller, que se
fosse um texto estaria constantemente a negrito, cá estão algumas táticas de
choque, um descuido algo calculado, os dramáticos gestos, aquela indecorosa e
incondicional entrega à hipérbole. Mas falta, por exemplo, o sentido de
aventura – na verdade, era quase um desporto – que impunha às suas próprias
rotinas. Era divertido, mas herético. Gostava de apanhar de surpresa os temas
de que era autor, enquanto, de sobrancelha arqueada, ia interrogando
continuamente uma audiência que parecia antecipar todos os seus movimentos: “Vocês
têm a certeza que já conhecem esta?”, perguntava, trocando as voltas a ‘Ain’t
Misbehavin’’, ‘Honeysuckle Rose’ ou ‘Jitterbug Waltz’. Comportava-se como se
fosse o criador de uma música imoral, mas não era desprovido de vida interior
nem apenas um talentoso populista. Acima de tudo, à custa de tanta audácia,
invenção e malícia, cultivou um estilo quase autónomo. Moran sabe que a paródia
pode ser um tipo de extrema-unção. Mas não faz mais pelos vivos um discurso que
em tudo toca e a nada efetivamente adere.
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